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domingo, 19 de fevereiro de 2012

seqüência

tinha um pesadelo onde todos os dias eram iguais.

eu não sabia quando começava, nem onde terminava

nele as casas eram iguais, todas quadradas, beges, paredes encardidas e uma janela bem pequena no alto da parede da frente, o vidro também encardido

não haviam portões, nem quintais, nem pessoas

ruas intermináveis

uma sequência infinita de postes de concreto

as ruas eram bem estreitas, as casas enormes, pareciam esconder o céu

o céu, esse era sempre cinza

no trabalho, milhões de computadores

milhões de pessoas idênticas operando computadores

no pesadelo eu era parte disso

no sonho eu era tudo aquilo e não existia

eu não sentia nada

o sonho nunca terminou

(poema da Juliana publicado na Casuística)

sábado, 18 de fevereiro de 2012

quero café da manhã...

quero café da manhã


na beira da minha cama

quero toalhas floridas

quero torradas e manteiga

fresca

o leite não derramado

não quero o sangue coalhado

não quero a santa miséria

e todos os seus sub-produtos

desfilando encrespada

no diário matinal



quero que o morro seja verde só

de matos e árvores altas

que seja um bom paradeiro

para nuvens escuras



quero ser menos gentil

não quero ser cordial

com quem me alimenta de fel e veneno



as armas estão carregadas

armadas na mão de meninos

agora nutridos pelos santos bandidos do morro



um vintêm só minha tia

dois real meu patrão

a carteira

a bolsa

desce do carro playboy

que é isso leva aí

duas pedrinha só

olha os homi subindo

esse mês tirei uma TV de 42



o suor de meu pai

escorrendo de graça

pelas latrinas

a alienação de minha mãe

pós-doutora em telenovelas

o deputado impune

a puta na esquina

a cachaça de graça

a especulação financeira

a respeito deste poema

o microondas queimando mais um rato numa viela qualquer

as igrejas lotadas de fiéis comovidos com a caridade

os televisores ligados

à frente de milhares de cabeças que

desistiram de tentar pensar

são subprodutos da miséria

que cresce, que se reproduz

na exata proporção de olhos que

fecham-se para não vê-la

e de neurônios que torram

movidos pelo dispositivo automático

autoregulador, autoendossador

automasturbador, autometiculador

autoremovedor, autodesenvolvedor, automobilizador

autopandecísta, autodeletador, autoconvencedor, autodesligador escondido bem no fundo do nosso cú ou de algum lugar a que não nos atrevemos mexer dado monte de bostas que temos tido dificuldades em deixar de ser.

(poema do Jeison Heiler; o blog dele é  http://verborragio.blogspot.com/)

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Vulto

Poesia do Jeff. Desenho do João da Silva.
Pra ver mais coisas do jeff entre em http://eupassarin.wordpress.com/

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Mundo Belezinha




Gravata Colorida (Solano Trindade)



quando eu tiver bastante pão 

para meus filhos 
para minha amada 
pros meus amigos 
e pros meus vizinhos 
quando eu tiver 
livros para ler 
então eu comprarei 
uma gravata colorida 
larga 
bonita 
e darei um laço perfeito 
e ficarei mostrando 
a minha gravata colorida 
a todos os que gostam 
de gente engravatada


Poema de Solano Trindade (1908-1974) tirado do Boletim do Acampamento Dandara do MTST - Movimento dos Trabalhadores Sem Teto - que fica no Jardim Minda, em Hortolândia.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

macaco espacial - por Said Leoni


 sinto-me feliz, e é claro que estou sendo irônico
cada vez mais adequado à rotina
falta-me apenas ser enviado para o espaço sideral

a coisa é simples, questão de aritmética
trabalha-se “x” para ganhar-se “y”
em um cálculo diretamente proporcional

e assim a vida repete-se apenas multiplicando
toda a simples equação por trezentos e sessenta e cinco
anulando os erros aplicando método exponencial

dia pós dia, noite à noite, com sono ou insone
consumando todas as energias
para que tudo se conclua em sacro ritual

é claro que toda infância e juventude
regada a brincadeira e constante educação são espólios
para apenas alimentar o sistema reproducional

mas não se pode esquecer dos muitos excluídos
que privados dos espólios tendem por estatística
a tornarem-se classe fatalmente marginal

porém, com muito esforço e vontade
se batalharem na vida e superarem todas as dificuldades
serão recompensados com medalha de mérito pessoal

um mundo assim perfeito e justo
é, desde que o homem deixou de ser macaco e viajou ao espaço,
o melhor exemplo de felicidade social

fomos a lua, mandamos robôs à Marte
todos prontos para desbravar todo o universo
e criar em cada lugar uma filial

a mão-de-obra é chinesa com custo quase nulo
e para driblar a concorrência é só sonegar os impostos
nada que não se encaixe em uma lógica empresarial

uma dúvida porém se faz pertinente
e para esse projeto torna-se empecilho:
o que fazer com a moralidade da família tradicional?

pergunta boa com resposta fácil,
para combater a barreira da tradição
nada melhor que criar uma nova utopia ideal

tem-se assim sem muito esforço
uma nova realidade baseada no progresso humano
criação do novo, desde o nascimento até o seu final